Eu, Karabá.

Eu, Karabá., Eu, Karabá., Goeie Life

Por que o nome “Karabah”?

Karabá é uma personagem do longa-metragem francês “Kiriku e a feiticeira” (1998), inspirado em uma lenda africana. A bruxa é retratada como temida e má. A mãe de Kiriku comenta, em seu nascimento, que a feiticeira secou a fonte do povo e comeu todos os homens de sua aldeia.

Ao longo da história, descobrimos, quando Kiriku encontra seu avô no alto de uma montanha, o mais velho conta que na verdade não foi ela que secou a fonte, foi um pequeno monstro que ali cresceu e entalou. E que ela não comeu ninguém, os transformou. Comenta também que Karabá detesta crianças, despreza mulheres e odeia os homens. Porque esses últimos, enfiaram-lhe um espinho nas costas, tão profundo que somente pode ser retirado com os dentes. Espinho este que lhe causa uma dor tão profunda, que a torna má. Sua maldade é uma reação, se ação sofrida por ela fora boa, a reação também seria. Mas como não fora, ela se tornou má.

Quando Kiriku consegue retirar o espinho de suas costas, Karabá grita com tal intensidade que se escuta na aldeia.

Esse grito representa o de todas que foram, de um jeito ou de outro, oprimidas pelos homens, violentadas, que carregaram, durante anos, um espinho nas costas, revoltando-se, às vezes, mas sem ter a coragem de dar o verdadeiro grito de liberdade. Aquele que veio romper o silêncio das mulheres e transformar a opressão, o ódio, em amor. Elucidando a vitória, ainda que depois de muita angústia. (HUNDZINSKI, 2012)

E daqui, detrás da minha tela, olho Karabá com anseio. Quantas Karabás não vemos no dia a dia? Mulheres que recebem um espinho por dia em suas costas e alguns deles nem com dentes é possível retirar. Nomeados com substantivos de pura violência e violações de direitos: São mortes, negligências, imperícias, racismo institucional e estrutural, violência de gênero, violência doméstica, intolerância religiosa, falta de oportunidade de trabalho. Se continuo, esse porquê nunca será concluso, uma vez que:

“Ser negra e mulher no Brasil é ser objeto de tripla discriminação, uma vez que os estereótipos gerados pelo racismo e pelo sexismo a colocam no mais baixo nível de opressão.” (GONZALEZ, 1982, p.97).

Neste blog, tenho como objetivo romper meu próprio silêncio e de outras mulheres, afinal “Muitas vezes penso que preciso dizer as coisas que me parecem mais importantes, verbalizá-las, compartilhá-las, mesmo correndo o risco de que sejam rejeitadas ou mal-entendidas. Mais além do que qualquer outro efeito, o fato de dizê-las me faz bem” (Audre Lorde,1977).

Gerar debates, conversas e discussões sobre Direitos Humanos e os espinhos que nos incomodam, maltratam, matam e corroem e pouco a pouco promover o nosso empoderamento. Nossa ruptura do silêncio. Retirar nosso espinho. Cumprir nosso direito à dignidade.

“Que palavras ainda lhes faltam? O que necessitam dizer? Que tiranias vocês engolem cada dia e tentam torná-las suas, até asfixiar-se e morrer por elas, sempre em silêncio? Talvez para algumas de vocês hoje, aqui, eu represento um de seus medos.”

Audre Lorde

Para que sejamos enfim

Nós, Karabah.

[Crédito da Imagem: BY RonAckins]


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